Sociedade Brasileira de Cardiologia alerta que o pão francês tem quantidade de sal além do indicado.

No café da manhã, lanche ou na janta; com manteiga, geleia, patê, com queijo e/ou presunto, o pão francês está presente na mesa de boa parte dos lares brasileiros. Mas o que muita gente não sabe é que a quantidade de sal colocado nas massas para produzir a iguaria é muito superior à recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

A OMS recomenda que as pessoas consumam, em média, cinco gramas de sal por dia, mas em Alagoas, segundo um levantamento da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) em 14 estados, o pão francês possui entre 15 e 18 gramas (g) de sal por quilo de massa. Isso representa, num pãozinho de 50g de peso, pelo menos 0,75g de sal por unidade.

Portanto, uma pessoa que come seis pães por dia – três no café da manhã e três no jantar – está ingerindo 4,5g de sal diariamente, ou seja, quase a totalidade recomendada pela OMS. Sem contar a quantidade de sal na manteiga, queijo ou presunto.

Para dificultar ainda mais o controle de ingestão de sal, a quantidade encontrada pela SBC nos pães franceses nos estados é disforme. A variação da menor quantidade – Rio Grande do Norte, com 8g – para a maior – Goiás, com 50g – é de 625%. A variação na quantidade de sal é grande até mesmo dentro dos estados.

Segundo a SBC, a média de sal no quilo de massa em Alagoas é de 16,5g, o que deixa o estado no 10º lugar entre os 14 estados que mais colocam sal na massa do pão francês. No critério variação, original do levantamento, Alagoas é o que possui a menor.

Goiás é o estado com diferença entre a quantidade mínima e máxima: de 12g a 50g e com a maior média de sal por quilo de massa. Em seguida vem a Paraíba.

O Maranhão é o estado com a menor média de sal por quilo de massa do pão francês entre os estados avaliados com 12,5g. O Rio Grande do Norte, estado com a menor quantidade identificada pela SBC, possui a segunda menor média de sal, com 14g.

Consumo do pão requer cuidados também devido aos carboidratos

O consumo excessivo de sal pode acarretar vários riscos à saúde, como hipertensão arterial, doenças renais e cardiovasculares. O sódio, componente químico do sal, é responsável por regular a quantidade de líquido dentro e fora das células e em grande quantidade no sangue, o corpo passa a reter mais água. Isso sobrecarrega os rins e o coração.

Por isso, todos os alimentos produzidos artificialmente possuem sal em sua composição. Ele ajuda na conservação desses produtos e, por isso, todos merecem o devido cuidado em sua ingestão. Para a cardiologista Maria Alayde Mendonça, o pão não é um alimento “tão bonzinho” e também requer cuidados em seu consumo, principalmente para quem sofre de hipertensão arterial.

“Não só pelo sal, mas também pelo carboidrato que tem nele, que é absorvido em 100% pelo organismo, o pão requer atenção, seja pelo sal, seja pelo carboidrato. O excesso de peso também contribui para elevação da pressão arterial. E com o aumento da pressão, aumenta a chance de derrames e infartos”, explica Maria Alayde.

Contudo, a médica destaca que hoje as receitas já estão levando em consideração os problemas de saúde que a ingestão de sal em excesso pode provocar.

“Elas [receitas], quando começaram a ser produzidas se sabia pouco sobre o impacto negativo do sal sobre a pressão arterial, assim como a frequência de indivíduos hipertensos. De lá para cá, o conhecimento médico especifico avançou muito, mas ainda não se conseguiu avançar de forma suficiente na redução do sal dos alimentos condicionados para durar algum tempo, apesar de a sociedade estar se adaptando a esse processo. Hoje já existem leis que regulam a quantidade de sal no Brasil, mesmo que ainda não a ponto de torna-los 100% saudáveis”, explica Maria Alayde.

Menos sal é melhor, mas paladar do cliente precisa se adaptar

Seu Neurivan Alves é padeiro há 34 anos. Ele começou o ofício com o pai na cidade de Boca da Mata e há 24 tem empresa própria. Por dia, sua panificação produz 12.600 pães, sendo que 8.800 unidades são de pão francês. Ele reconhece que a quantidade de sal por quilo de massa é grande, mas isso, segundo ele, está mudando.

“Aqui nós usamos 17g de sal por quilo de massa para fazer o pão francês e o melhor é diminuir essa quantidade, mas não dá para fazer de uma vez porque é preciso acostumar o paladar dos fregueses”, diz Neurivan explicando que o sal ajuda a desenvolver melhor o pão em sua fabricação.

O panificador também ressalta que a quantidade de sal colocado na massa do pão francês varia de acordo com a qualidade da farinha utilizada. Além disso, explica, é preciso levar em consideração os demais ingredientes usados no processo.

“A água tem que ser processa e gelada, tem o fermento, açúcar e o maquinário. Tudo conta. Só para fazermos nossa quantidade diária de pão francês, nós usamos cerca de 350 quilos de farinha e para os demais tipos de pão, cerca de 280 quilos. Todo o processo para fazer o pão francês leva entre três e quatro horas”, relata.

TRADIÇÃO

Para Neurivan, o pão francês continua sendo o carro-chefe das padarias no país.  “É a tradição e ele vai bem com tudo, podendo ser consumido com qualquer coisa”.

No Brasil, o pão francês surgiu no início do século 20 e naquele período, com a abertura ao comércio externo, o país começou a importar costumes de outros países, principalmente da Europa. E para a elite brasileira, ir a Paris uma vez por ano era quase obrigação.

Como a República no país era nova, ela tentava desfazer a organização social do antigo Império e a influência da colonização portuguesa. Logo, os cafés e confeitarias se tornaram o principal ponto de encontro dos mais ricos. Isso gerou a exigência por um pão com miolo branco dos franceses, pois até então, o predomínio era a produção de pães com cascas e miolos escuros, como em Portugal.

Assim, seguindo a descrição dos que voltavam da França, os padeiros criaram a receita do pão francês brasileiro, porém mais macio que o original.

Consumidoras vão mudar relação com o alimento

Vera Paulino é bibliotecária e Patrícia Pedri é empresária do ramo de alimentos. Ambas dizem comer pão francês ao menos em duas refeições por dia – café da manhã e janta – e, esporadicamente, no almoço. Ambas também desconheciam a quantidade de sal por quilo de massa na produção da iguaria levantada pela SBC. Vera diz comer dois pães por dia e Patrícia entre três e seis.

As duas possuem histórico de hipertensão na família e diante da informação sobre quantidade de sal contida no pão francês, elas pretendem mudar seus hábitos alimentares, pelo menos nesse quesito.

“Eu já me controlo um bocado no sal, justamente porque em minha família paterna a maioria é de hipertensos. Até compro o pão integral, mas como é um pouco mais caro, acabo ficando com ‘francesinho’ mesmo, mas na minha preocupação com o sal, jamais imaginei que o pão francês mereceria atenção, exceto pelo carboidrato”, diz Vera.

Já Patrícia diz que prefere os pães caseiros, mas devido à correria do dia a dia, acaba comendo o pão francês, cuja quantidade superior de sal ela conhecia, mas não na proporção apontada pela SBC.

“Sempre soube que o francês tinha mais sal que os demais pães, mas nessa quantidade, não. Agora vou tentar preparar mais pães caseiros, pois assim tenho mais controle sobre a quantidade de sal e também sobre os conservantes”, diz a empresária.

Fonte: Tribuna Hoje